segunda-feira, abril 10, 2006

A outra face da América

A questão dos imigrantes divide os
EUA, mas sem eles a economia do
país entraria em pane.

Colaborou Osmar Freitas Jr. – Nova York

Todos concordam nos EUA que o país enfrenta graves problemas com o crescente fluxo de estrangeiros clandestinos em seu território – cerca de 11 milhões de imigrantes ilegais, dos quais dois milhões são brasileiros, numa população total de 298 milhões
de pessoas. Todos concordam, também, que alguma coisa tem de ser feita.
Mas fazer o quê? É nesse ponto que as opiniões se dividem. O Congresso está rachado entre as propostas da Câmara dos Representantes e do Senado. Os deputados conservadores aprovaram um projeto draconiano que prevê desde a construção de um muro duplo de quase 400 quilômetros separando os EUA do vizinho México até a criminalização da ajuda humanitária a residentes ilegais. A lista de medidas restritivas e punitivas veta o direito à educação e ao atendimento médico para quem não tiver documentos legítimos e prevê, sem possibilidade de apelação, um ano de cadeia para o imigrante antes de sua deportação. “Essa legislação puniria o bom samaritano da Bíblia e talvez até Jesus Cristo”, disse a senadora democrata Hillary Clinton.

O Senado contra-atacou e aprovou o chamado programa para “trabalhadores-convidados”, patrocinado pelos senadores John McCain (republicano) e Ted Kennedy (democrata). Prevê que sejam dadas condições para os imigrantes ilegais conseguirem residência permanente, sendo que, em troca disso, pagariam multa de US$ 2 mil e demais impostos correspondentes aos anos que estiveram na clandestinidade. Deles, também seria exigido bom atestado de antecedentes e fluência no idioma inglês. Preenchidos todos os critérios, o imigrante poderia se tornar um cidadão americano com todos os direitos – menos o de se candidatar à Presidência dos EUA. O presidente George W. Bush disse que concorda com “o espírito da lei”, só que, na prática, a sua concordância é mais aparente que real: ele se opõe ao ponto crucial da questão, que é o do direito à cidadania.

A Câmara dos Representantes, dominada pelo Partido Republicano, deixou-se levar pelo radicalismo xenófobo da extrema direita, que vê com horror o tecido social americano mudar de cor e ficar cada vez mais marrom. Milhões de americanos saíram às ruas em diversas cidades protestando contra esse projeto. Já o Senado foi influenciado, principalmente, pelos lobistas da agroindústria, do setor hoteleiro e das múltiplas áreas que dependem da mão-de-obra dos trabalhadores ilegais: a cada grupo de cinco trabalhadores de baixa renda, um é imigrante, e isso mostra que a economia sofreria uma pane se as leis de imigração fossem tomadas ao pé da letra. É sobretudo por esse motivo que 73% dos americanos desaprovam a política de tolerância zero contra os imigrantes e querem que eles tenham a chance de cidadania no país.

http://www.terra.com.br/istoe/

Nenhum comentário: