Nelson Bacic Olic
Em 2005, a secretária de Estado norte-americana, Condoleezza Rice, declarou que seu país não teria, naquele momento, planos para atacar militarmente o Irã. Afirmava também que haveria ainda um leque de pressões diplomáticas a serem usadas para que o governo iraniano cumprisse seus compromissos internacionais.
A desconfiança de que a administração Bush se preparava para atacar o Irã surgiu por conta de reportagem publicada em dezembro de 2004 pela revista New Yorker que dava detalhes sobre a ação bélica que seria levada a cabo pelo governo norte-americano. Tudo indica de que a estratégia que seria utilizada não teria semelhanças com aquela usada na invasão do Iraque já que, no caso do Irã, as ações iniciais seriam de bombardeios sobre as instalações nucleares do país.
No último ano, as relações diplomáticas entre os Estados Unidos e o Irã se deterioraram ainda mais, fazendo surgir rumores mais insistentes de um eminente ataque norte-americano às instalações nucleares iranianas. Esses rumores indicam inclusive que haveria comandos das forças especiais do Estados Unidos infiltrados no Irã, mantendo contato com setores da oposição ao governo iraniano e prontos para agir praticando ações de sabotagem.
O governo iraniano continua assegurando que não planeja enriquecer urânio para fins militares e que seu objetivo é produzir energia, mas os serviços de inteligência dos EUA afirmam que existe um projeto nuclear paralelo sendo desenvolvido para fins não tão nobres. Segundo o Pentágono, caso o Irã se tornasse uma potência nuclear, colocaria em risco o já delicado equilíbrio geopolítico do Oriente Médio. Usam como um dos argumentos os discursos inflamados do presidente iraniano Mahamud Ahmadinejad propondo “riscar Israel do mapa”.
O Irã também tem sido acusado de auxiliar grupos extremistas como o Hezbollah libanês e suspeita-se que estaria por traz de alguns grupos insurgentes que atuam no Iraque. Não se deve esquecer que o país, juntamente com o Iraque e a Coréia do Norte, foi incluído pelo governo Bush como país integrante do “eixo do mal”.
A cautela norte-americana em relação a uma ação bélica contra o Irã justifica-se por vários motivos. No momento atual, seria contraproducente abrir mais uma frente de luta. A situação no Afeganistão, alvo dos ataques dos EUA em 2001, ainda é instável e no Iraque, nada faz crer que a situação apresente melhora significativa em futuro próximo. Esses dois países compartilham fronteiras terrestres com o Irã e como os três fazem parte do mundo islâmico, a eventual ação militar seria motivo para acirrar ainda mais o ódio contra os norte-americanos.
Irã e Iraque têm uma série de pontos comuns (grandes produtores de petróleo, por exemplo), mas possuem diferenças histórico-geográficas marcantes. O Iraque é uma “entidade” política artificial criada pelo imperialismo britânico no início do século XX, enquanto o Irã (nome atual da antiga Pérsia), é um país milenar com fronteiras forjadas ao longo da história. Além disso, a fronteira entre os dois países separa o mundo árabe (Iraque) do mundo persa (Irã).
O Irã é quase quatro vezes mais extenso que o Iraque, possuindo um meio natural bem mais diversificado, onde se destacam as regiões desérticas do planalto central iraniano e áreas montanhosas, como a dos Montes Elburz e Zagros. Diferentemente do Iraque, país quase sem acesso ao mar, o Irã possui litorais “abertos” (Golfo Pérsico e Oceano Índico), além da costa banhada pelo mar Cáspio, um mar fechado.
Com cerca de 70 milhões de habitantes, o Irã tem uma população quase três vezes maior que a iraquiana e uma composição étnica mais variada. Os iranianos de origem persa são um pouco mais da metade da população do país que conta também com expressivo número de azeris (25%), curdos (10%), árabes (3%), baluques (3%), turcomenos (1,5%) dentre outros que, apesar das diferenças de origem étnica, compartilham de uma forte coesão nacional.
Como o Iraque, o Irã faz parte do grupo de mais de 60 países componentes do mundo islâmico. O que individualiza o Irã é que ele possui o maior número de muçulmanos xiitas. Apesar dos xiitas serem cerca de 90% dos iranianos, só conseguiram chegar ao poder em 1979 através de uma revolução que, derrubando a monarquia, pôs fim ao histórico domínio político da minoria sunita (2% da população). A revolução liderada pelo aiatolá Khomeini, líder espiritual dos xiitas iranianos, é considerada um dos principais eventos políticos em países subdesenvolvidos nos últimos 30 anos.
A revolução levou à implantação de uma república teocrática, na qual as leis do país são submetidas ao crivo do clero xiita e transformou Irã no principal pólo de difusão do xiismo. Clamando contra os “satânicos” Estados Unidos, o Ocidente e os regimes corruptos de países islâmicos, ressaltou o papel do Irã como pólo radical de oposição à disseminação dos valores ocidentais. Desde então, o Irã possui um histórico de quase três décadas de tensões com o governo dos EUA. A eventual ação militar contra o Irã se constituiria no mais novo capítulo, com um enredo bem mais complexo, da história de tensões entre os dois países.
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