quinta-feira, setembro 24, 2009

O homem no centro da crise hondurenha: quem é Manuel Zelaya?

 

Filho de poderoso fazendeiro, Manuel Zelaya foi eleito em 2005 pelo Partido Nacional Hondurenho, de direita, com um programa também de centro-direita, num cenário em que poucas famílias da elite controlavam a economia local, e onde a esquerda havia sido escanteada do poder. Apesar disso, Zelaya promoveu reformas econômicas e sociais consideradas de esquerda, custando-lhe a perda do apoio da elite. O artigo é de Larissa Ramina.

Larissa Ramina (*)

Em 28 de junho, Manuel Zelaya fora expulso de seu país, que deixara vestindo pijamas. Destituído por um golpe de Estado, amplamente condenado pela comunidade internacional, refugiou-se na vizinha Nicarágua. Após 3 meses de tentativas frustradas, atravessou clandestinamente as fronteiras hondurenhas e abrigou-se na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa, no dia 21 de setembro. Seu retorno ocorre em um momento crucial, na véspera da reunião da Assembléia Geral da ONU, que deverá reunir em Nova Iorque chefes de Estado de todo o planeta.
O governo golpista de Roberto Micheletti apressou-se em adotar medidas militares, dispersando violentamente os cerca de 4000 partidários de Zelaya reunidos no local. Um toque de recolher foi imposto na capital, e os aeroportos, escolas e comércio foram fechados. Água, luz e telefone da Embaixada foram cortados. A OEA adotou resolução pedindo a recondução do líder deposto ao poder e o respeito de sua integridade física. O governo brasileiro solicitou a intervenção do Conselho de Segurança da ONU para garantir a segurança da Embaixada.
Mas afinal, quem é Manuel Zelaya, o homem no centro da crise hondurenha?
Candidato conservador às eleições de 2006, Zelaya transformou-se após o golpe em herói popular, sendo tratado pela oposição como esquerdista e comunista. Todavia, o homem de chapéu estilo “cowboy”, camisa desabotoada, botas texanas e bigode marcante não é facilmente descrito.
Filho de poderoso fazendeiro, fora eleito em 2005 pelo Partido Nacional Hondurenho, de direita, com um programa também de centro-direita, num cenário em que poucas famílias da elite controlavam a economia local, e onde a esquerda havia sido escanteada do poder. Apesar disso, Zelaya promoveu reformas econômicas e sociais consideradas de esquerda, custando-lhe a perda do apoio da elite.
Diante de uma urgência financeira para concretizar reformas sociais no país em que 70% da população vive abaixo da linha da miséria, Zelaya buscou ajuda no setor privado, que firmemente lhe virou as costas. O Banco Mundial, por sua vez, ofereceu-lhe uma ajuda irrisória de U$ 10 milhões. O empréstimo relevante, de U$ 132 milhões, veio de Hugo Chávez.
A aliança com a Venezuela, sacramentada na adesão à Alternativa Bolivariana para as Américas, marcou a espetacular virada de Zelaya à esquerda, ilustrada pelo aumento de 65% do salário mínimo hondurenho, que passou de U$189 para U$ 289. Esse fato marcou o rompimento definitivo com o conservadorismo local. Não obstante, Zelaya foi o primeiro chefe de Estado hondurenho a visitar Cuba desde 1959, onde se desculpou publicamente com Fidel Castro pelo fato de seu país ter servido de base norte-americana para a luta contra a guerrilha; aproximou-se de Daniel Ortega na Nicarágua e protestou contra a ingerência dos EUA na Venezuela e na Bolívia. Para coroar sua posição, declarou na Assembléia Geral da ONU que o capitalismo estaria “devorando os seres humanos”.
Em seguida, isolado pelo patronato e por seu próprio partido, e já começando a inquietar os EUA, Manuel Zelaya insistiu no que chamou de “revolução pacífica” para a instauração de uma “democracia participativa”, convocando um referendo para consultar acerca da possibilidade de modificar a Constituição e permitir a reeleição do chefe de Estado. Essa empreitada, já iniciada por outros chefes de Estado na América Latina, entre os quais Hugo Chávez, Evo Morales, Rafael Correa e também o conservador Álvaro Uribe, foi considerada ilegal pela Corte suprema hondurenha, apoiada por alguns membros do Congresso, por parte do Exército e pelos meios empresariais. Zelaya foi preso pelos militares na manhã do referendo, no dia 28 de junho de 2009. No Brasil, encontrou o apoio que lhe permitiu retornar a seu país. Porque o Brasil e não Venezuela? A resposta é estratégica, e o Presidente brasileiro tem reputação na Europa e nos EUA muito melhor do que o Presidente venezuelano.
O golpe de Estado dirigiu-se a um Presidente que fora eleito por um partido de direita, e que no decorrer do mandato deu uma guinada à esquerda. Micheletti anunciou que Zelaya seria preso e julgado por traição, caso entrasse em Honduras. O homem no centro da crise fora considerado, portanto, um traidor: um traidor da elite hondurenha.
Larissa Ramina, Doutora em Direito Internacional pela USP e Professora da UniBrasil.

segunda-feira, setembro 21, 2009

“EUA tem o maior orçamento militar do mundo e usa para tomar riquezas dos demais”

Pesquisadora Eva Golinger denuncia:

Os presidentes dos países que integram a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), reunidos em Kinshasa no dia 11, reivindicaram o imediato fim das sanções contra o Zimbábue.

O anfitrião do encontro, presidente da República Democrática do Congo, Joseph Kabila, denunciou que as sanções sabotam o desenvolvimento e o bem-estar do povo do Zimbábue.

O comunicado final do encontro afirma que “considerando os progressos gerados pela aplicação de um acordo político global, chamamos a comunidade internacional a levantar toda forma de sanção contra o Zimbábue”.

REFORMA AGRÁRIA

Para manter as sanções econômicas, que incluem a negação de fundos por instituições financeiras, os EUA seguem denunciando ataques à democracia.

O boicote contra a ex-colônia britânica, de 11 milhões de habitantes e com 73% de sua população em zonas rurais, fez-se mais forte desde o ano 2000, quando o presidente Robert Mugabe acelerou a reforma agrária.

Na reunião participaram os chefes de Estado Jacob Zuma, da África do Sul; Armando Guebuza, de Moçambique; Robert Mugabe, do Zimbábue, e Lucas Pohamba, da Namíbia, além de delegações dos demais integrantes da Comunidade, que são Angola, Botsuana, Lesoto, Mada-gascar, Malawi, Suazilândia, Tanzânia e Zâmbia.

Uma delegação da União Européia visitou o Zimbábue durante esta semana e foi recebida por Robert Mugabe, integrantes de seu partido Zanu-PF; pelo primeiro-ministro Morgan Tsvangirai e seu partido MDC-T.

O jornal do Zimbá-bue, The Herald, denunciou que Tsvangirai “pretende que a União Européia mantenha as sanções contra o Zimbábue” apesar do acordo firmado pelos dois partidos e apoiado pela União Africana e pela SADC denominado Global Political Agreement (GPA - Acordo Político Global), pelo qual Tsvangirai assumiu o posto de primeiro-ministro. Ele participou de um comício em Bulawyo, mesma cidade e no mesmo dia em que membros da delegação se encontraram com ele para dizer que No comício ele declarou que “o partido Zanu-PF continua a violar a lei, perseguir parlamentares nossos e a ignorar tratados internacionais”.

Integrantes do partido Zanu-PF também denunciaram que nos encontros com os europeus somente eles argumentavam contra as sanções enquanto que os do MDC-T “ficavam estra-nhamente em silêncio”.

O The Herald denuncia que Tsvangirai quer forçar o governo a lhe ceder mais postos do que o acordado. O ministro do Desenvolvimento da Suécia, Gumilla Carlson, defendeu Tsvan-girai dizendo que “as medidas restritivas são decididas pela União Européia” e que “não cabe ao primeiro-ministro [Tsvangirai] retirá-las”.

MUGABE

O presidente Mugabe esclareceu aos europeus que o Zanu-PF fez a sua parte e o governo procedeu à posse de Tsvangirai e demais ministros por ele indicados. Mugabe declarou que deputados do MDC-T foram presos sob acusação de sequestro e estupro “ofensas muito graves em qualquer país do mundo”.

“Ou os senhores pretendem que os deputados no Zimbábue estejam acima da lei?”, questionou o presidente. Mugabe esclareceu que o ministro do Interior, encarregado da polícia, foi indicação acordada pelo Zanu-PF e MDC-T. “Eu duvido que ele mandaria prender de forma arbitrária membros de seu próprio partido”, disse Mugabe.

O presidente Mu-gabe pediu aos europeus que prestassem atenção aos pontos de vista africanos sobre a questão do Zimbábue como referentes a um país soberano e independente. “A Europa deve se reportar a nós como um país africano e não como se fôssemos membros de sua comunidade. Nós não somos parte da Europa”.

segunda-feira, setembro 14, 2009

O primeiro 11 de setembro sem Bush e Cheney

 

Duas guerras sem final à vista e milhões de cadáveres depois (entre eles os de mais de 5 mil soldados americanos mortos, 4343 no Iraque e 824 no Afeganistão), os Estados Unidos de Barack Obama tentam distanciar-se ao menos da histeria belicista disseminada pela dupla Bush-Cheney. Como desta vez o ritual anual na área do WTC foi bem comportado, pode-se ainda fingir que não persistem as teimosas especulações paranóicas sobre suposta cumplicidade do governo anterior. O artigo é de Argemiro Ferreira.

Argemiro Ferreira

Apesar de marcar o 8º aniversário das ações terroristas de 2001, o 11/9 de 2009 baixou a bola. Pela 1ª vez a data foi lembrada sem as presenças nefastas, na Casa Branca, de George Bush e Dick Cheney - notórios beneficiários políticos dela, obstinados em manipular o episódio para extremar sua agenda neoconservadora exorcizada atualmente dentro e fora dos EUA.
Duas guerras sem final à vista e milhões de cadáveres depois (entre eles os de mais de 5 mil soldados americanos mortos, 4343 no Iraque e 824 no Afeganistão), os EUA de Barack Obama tentam distanciar-se ao menos da histeria belicista disseminada pela dupla Bush-Cheney. Neste ano 8 do 11 de setembro conformaram-se com menos exagero nas homenagens às vítimas das ações terroristas.
De Nova York o jornalista Sérgio Dávila enviou para a Folha de S.Paulo um texto que refletiu bem o novo clima, mais civilizado, mesmo com a repetição parcial do ritual cumprido a cada setembro desde 2001. Oito anos depois, explicou ele, “ninguém sabe o que fazer com o evento histórico, tanto de maneira literal como figurada”.
O presidente Barack Obama, depois de avisar que não iria ao World Trade Center de Nova York, ficou na capital e participou de ato em homenagem às vítimas do avião lançado sobre o Pentágono. Como desta vez o ritual anual na área do WTC foi bem comportado, pode-se ainda fingir que não persistem as teimosas especulações paranóicas sobre suposta cumplicidade do governo anterior.
Os equívocos da guerra ao terror
De tal forma Bush e Cheney exploraram em benefício próprio - e da agenda deles - o episódio traumático de 2001 que ficou difícil convencer críticos mais radicais (do governo, das guerras e da arrogância militar) de que nada tiveram a ver com as ações terroristas - simplesmente as abraçaram como pretexto para impor aquilo que em condições normais o país teria rejeitado.
Outra acusação relacionada ao 11/9 poderia sim - e ainda pode - ser feita ao governo Bush e à facção neoconservadora nele empoleirada graças ao papel preponderante do vice Cheney. Ou por negligência, ou ainda por arrogância, não teria deixado o país vulnerável ao subestimar o aviso grave do governo Clinton sobre a ameaça representada por Osama Bin Laden?
Já havia indícios disso antes mas na véspera deste último 11/9 surgiu mais um depoimento capaz de reforçar a suspeita: a entrevista à rede ABC de televisão de Elie Assaad, libanês de nascimento e informante durante 13 anos do FBI (Bureau Federal de Investigações). Sua história de sucesso foi a infiltração em pequena mesquita na periferia de Miami, que em 2006 levou à prisão de sete supostos terroristas.
Assaad relatou o episódio, tido como meritório, ao repórter Brian Ross da ABC. Oficialmente, uma operação sting contra “célula terrorista”. Mas contou ainda que o FBI, cultor de tais operações (armadilhas para apanhar muçulmanos ingênuos), o impedira no início de 2001, em Miami, de ir atrás da estrela maior do terrorismo - Mohammed Atta, o saudita que meses depois lideraria o ataque de 11/9.
“Podíamos ter impedido os ataques”
Assaad queixou-se agora de que teve a chance de desbaratar o complô para seqüestrar quatro aviões e lançá-los contra o World Trade Center de Nova York e o Pentágono na capital, sendo impedido pela política equivocada do FBI, que preferia concentrar-se em operações encobertas (sting), nas quais seus agentes empurravam gente despreparada para o extremismo.
No princípio de 2001 Assaad queria aceitar um convite para ir à casa de Adnan Shukrujumah, cujo pai dirigia a mesquita de Miami. Ali teria conhecido o plano do 11/9. Mas a idéia foi vetada pelo FBI, que o mandou evitar a visita e se limitar a alvos menores, meros terroristas potenciais (ironicamente, hoje o bureau oferece recompensa de US$5 milhões pela captura de Shukrujumah).
Durante a reportagem da ABC o repórter Brian Ross ouviu ainda Richard Clarke, que à época era o especialista em contra-terrorismo do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca. “Aquilo foi mais um exemplo da maneira como o sistema, antes do 11/9, tinha entrado em colapso”, observou Clarke, autor de Against All Enemies, o livro que expôs o colapso.
Se o sistema tivesse funcionado, disse o especialista em contra-terrorismo, “teríamos sido capazes de identificar aquelas pessoas antes dos ataques”. Mas o FBI preferia que Assaad, usando o nome “Mohammed”, atraisse gente simples e oferecesse dinheiro, dizendo-se representante pessoal de Bin Laden, para tarefas específicas em favor da causa islâmica - como explodir bomba na própria sede do bureau em Miami.
Os terroristas que o FBI produz
Assaad contou que ao ser solicitado, logo após o 11/9, a examinar fotos dos 19 sequestradores do avião, reconheceu o líder Mohammed Atta. “Era a prova de que eu estava 100% certo, tinha de ter ido atrás de Shukrujumah e Atta, como queria. E não dos outros, menores, como mandou o FBI. Fiquei tão enlouquecido que, num acesso, destruí os móveis em minha casa”, contou.
Na queixa de agora o espião disse que o FBI insistia no seu modelo sting. A partir de 1996 Assaad operou em 10 estados do país e no exterior. Os alvos, apanhados em armadilhas, eram sem importância, mas com aquilo o bureau de investigações acreditava que podia mostrar serviços - êxitos aparentes. Só que nos julgamentos os advogados às vezes provavam ao júri que os réus eram na verdade vítimas do FBI.
Para a defesa, os réus, desinformados e ingênuos, tinham sido convencidos pelo próprio governo (o FBI), em troca de dinheiro, a cometer crimes. No caso célebre de Assaad, em 2006, os julgamentos de dois réus deram em nada (mistrial) enquanto cinco foram condenados por terrorismo nos demais. Mas Alberto González, Procurador Geral no governo Bush (e defensor da tortura), fez elogio público a Assaad pelas sete prisões.
Refere-se a esse caso conspícuo um vídeo obtido pela ABC e mostrado na entrevista do espião do FBI. Ali aparecem os sete fazendo juramentos de lealdade a Bin Laden e recebendo as boas vindas de Assaad à al-Qaeda. Em outro vídeo Assaad conta o dinheiro e o entrega a um do grupo. Obcecado em prolongar a histeria pos-11/9 o governo Bush festejava coisas assim, que prolongavam o estado de medo no país.
E hoje o ex-vice Cheney ainda defende a insanidade das políticas do governo Bush, como se coisas assim, juntamente com as torturas, fossem receita infalível contra o terrorismo.
Blog de Argemiro Ferreira

sexta-feira, setembro 04, 2009

A Nigéria e o perigo holandês

 

No oeste da África, no golfo da Guiné, entre o Benin e Camarões, o Níger e o Chade situa-se a Nigéria, um dos maiores países africanos – 923.768 Km2 de extensão territorial – com quase 150 milhões de habitantes. O mais populoso país do continente africano tem a maioria de sua população vivendo na miséria absoluta e só 25% dela está nas cidades.

Vários idiomas são falados no país, os das principais etinias que compõem 65% da população, os hussás, iorubas, ibos e fulanis. Os 35% restantes dividem-se em 245 pequenos grupos étnicos.

O idioma oficial é o inglês, herança da submissão à Inglaterra que colonizou o país até 1960 quando se tornou independente com o nome de República Federal da Nigéria e a capital em Lagos. Em 1991 a capital passou a ser a cidade de Abuja no centro geográfico do país.

A maioria da poluação, 50%, professa o islamismo, os outros 50% são cristãos católicos e protestantes ou professam os cultos tradicionais africanos.

71% dos nigerianos vivem com menos de 70 centavos de euros diários, a expectativa de vida é de 47 anos, 50% da população não tem acesso à água potável e o rio Níger é um dos mais poluídos do mundo pela ação predatória da industria química e petrolífera e pela mineração de urânio. 5,4% da população é vítima da epidemia de Aids.

Ao contrário do que demonstra a vida da maioria do povo nigeriano, a Nigéria não é um país pobre. Rica em petróleo é o oitavo produtor mundial – 2 milhões e 300 mil barris diários explorados e exportados por multinacionais.

A Nigéria não tem o controle sobre a produção da riqueza que responde por 95% das exportações e constitui-se em 80% de suas receitas. É membro da OPEP e possui imensas reservas de gás natural, as maiores da África, e que chegam a 190 trilhões de metros cúbicos embora estimativas apontem que elas podem ser ainda maiores. Há um projeto de construção de um gasoduto de 4.200km. passando pelo Níger e pela Argélia para levar gás à Europa para que ela seja menos dependente do gás vindo da Rússia.

O país sofre a escassez de gasolina, pois não sobra petróleo para ser refinado e abastecer o mercado interno, quase tudo o que é extraído é exportado. 40% da população não tem também acesso à eletricidade.

Seu solo é rico em ferro, estanho, carvão e urânio que também são explorados por empresas estrangeiras.

Sua agricultura produz apenas 20% das necessidades de consumo, tudo é importado e pago com a renda do petróleo.

Mas o petróleo é um recurso finito. Calcula-se que o petróleo nigeriano chegará ao máximo de produção em 2012 e a partir daí começará a declinar.

Em que situação ficará o país sem o mesmo nível de recursos gerados pelo petróleo se nada dessa riqueza imensa fica nas mãos dos nigerianos? Se ela não é investida no desenvolvimento industrial interno capaz de gerar empregos que permitam o fortalecimento do mercado interno e o desenvolvimento em outras esferas da atividade econômica que estimulem o país a crescer?

Estão na Nigéria todas as principais multinacionais petrolíferas do mundo e são elas que ditam as cartas do jogo no país. Como o petróleo não vai durar para sempre elas já buscam alternativas a ele na produção de agro-combustíveis e transgênicos. Para isso têm feito grandes investimentos na compra de terras para a produção de etanol.
A alemã Hoyer Co. Engenneering Gbr adquiriu 50 mil hectares de terras no fértil delta do Níger para produzir bio-combustível. A norte-americana Food For All International com apoio (e provavelmente com muito dinheiro) do governo nigeriano comprou milhares de hectares de terras também no delta do Níger para produzir combustível. Muitas empresas inglesas e algumas chinesas também já entraram nesse negócio.

ACORDOS LESIVOS

Toda a política do governo nigeriano é executada para cumprir acordos com os monopólios petrolíferos, que são isentos de todo tipo de taxas e impostos de importação sobre todo e qualquer produto relativo à produção do petróleo ou bio-combustível.

O governo não usa a riqueza do país, gerada pelo petróleo, para produzir outras riquezas e dotar o país de uma infra-estrutura capaz de promover o desenvolvimento e bem estar da população.

Tais acordos lesivos ao país e que permitem aos monopólios petrolíferos darem asas a sua ganância e auferirem superlucros, deixam um rastro de miséria, devastação, fome e desamparo de milhares de nigerianos, cuja diversidade étnica, cultural e religiosa é manipulada pelos prepostos e testas-de-ferro das multis para estimular conflitos de toda ordem em benefício de seus interesses econômicos no país.

A Nigéria está perdendo a chance de desenvolver-se enquanto ainda tem um pouco da riqueza proveniente do petróleo.

O governo não tem dinheiro para investir na industrialização, em educação, saúde, saneamento básico ou habitação e a injustiça generalizada na distribuição da riqueza do petróleo provoca uma grande tensão social.

Surgem guerrilhas que atacam as plataformas e oleodutos das multinacionais em vários pontos do país, mas em particular no delta do Níger.

SHELL

Movimentos sociais acusam a multinacional Shell de degradar o meio ambiente com a queima do gás a céu aberto nos poços de extração, o que vem causando graves prejuízos para saúde de milhares de nigerianos que sofrem de problemas respiratórios e câncer.

A Shell é acusada também de ser responsável pela poluição e degradação do rio Níger onde despeja detritos sem tratamento indiscriminadamente.

O “perigo holandês” no caso da Nigéria é proporcional ao seu tamanho e à sua população.

ROSANITA CAMPOS

quarta-feira, setembro 02, 2009

O tigre acuado pela crise

 

Um dos chamados Tigres Asiáticos sofrem com o colapso econômico global, que se reflete no aumento das taxas de desemprego

Um dos chamados Tigres Asiáticos sofrem com o colapso econômico global, que se reflete no aumento das taxas de desemprego

02/09/2009

Patrícia Benvenuti

da Redação

O rápido crescimento da Coreia do Sul, especialmente na década de 1990, em princípio parece um bom exemplo a ser seguido por países pobres que pretendem um fortalecimento de suas economias.

A atração de capital externo por meio de "benefícios" como mão-de-obra barata, isenção de impostos e baixos custos para instalação de empresas foi uma marca do crescimento sul-coreano, patrocinado, por mais de três décadas, pelos diferentes governos militares que se sucederam no país.

O mesmo modelo foi adotado por Taiwan, Hong Kong e Cingapura que, junto com a Coreia do Sul, ficaram conhecidos como Tigres Asiáticos, pela agressividade de suas manobras para alavancar a economia.

Os riscos da dependência em relação ao capital estrangeiro e ao neoliberalismo, porém, aparecem em momentos de instabilidade, como a atual crise econômica mundial. Segundo a ativista sul-coreana Aehwa Kim, integrante da Aliança Coreana de Movimentos Progressistas, o país está perto de alcançar a marca de um milhão de desempregados, e a expectativa é de que o número de demissões no país possa aumentar.

Ao lado de Seung-Hun Lee, integrante do Partido Democrático Trabalhista da Coreia do Sul, Aehwa veio ao Brasil para conhecer organizações de camponeses. Em entrevista ao Brasil de Fato, a ativista fala sobre as consequências do colapso econômico sobre os trabalhadores sul-coreanos, agravadas pelo conservadorismo do atual governo, e revela, ainda, alguns dos interesses que impedem a reunificação das duas Coreias.

Brasil de Fato – A senhora poderia comentar um pouco sobre a atual conjuntura político-econômica da Coreia do Sul?

Aehwa Kim – Acho que a Coreia não é um caso atípico em termos dessas questões. Nós tivemos os mesmos problemas que outros países. O governo sul-coreano, tanto o anterior como o atual, tem promovido tratados de livre comércio e políticas neoliberais. As questões políticas estão se tornando cada vez mais não democráticas e, no momento, temos uma situação econômica muito difícil como, por exemplo, o índice de desemprego no país. Estamos esperando que a população de desempregados na Coreia, como um todo, chegue a um milhão de pessoas, e nossa população total está por volta de 48 milhões de pessoas. Mas esses são os números que o governo está lançando. Dois anos atrás, o governo coreano aprovou uma lei sobre trabalhadores irregulares [temporários, que têm um contrato curto de trabalho]. Como nós temos muitos trabalhadores irregulares, o governo decidiu protegê-los. Então, fez uma nova lei limitando o período pelo qual estes seriam contratados. Como consequência, uma empresa só pode contratar um trabalhador por dois anos. Se você contratar um trabalhador irregular por mais de dois anos, a empresa tem que mudar sua condição, para regular. O governo acredita que essa é uma ideia excelente porque os trabalhadores irregulares continuariam trabalhando depois de dois anos, e com isso, reduziria seu número. Mas a realidade é muito diferente. Existe um vazio na lei, que os empregadores usam. Antes de dois anos, despedem os trabalhadores. Hoje, eles só estabelecem contratos irregulares com os trabalhadores por um ano ou, no máximo, menos de dois anos. Ou seja, ele nunca vai trabalhar esses dois anos para se tornar regular. Se a empresa não fizesse isso e não procedesse irregularmente, essa lei seria boa.

Julho deste ano seria o limite para que os trabalhadores irregulares se tornassem efetivos, mas o atual governo reinterpretou essa lei e disse: como a economia da Coreia não está boa, para ativá-la e para facilitar os negócios para as empresas, expandiu esse período que a lei prevê. Com isso, esse processo foi empurrado para frente, sem definir a próxima data [para entrar em vigor]. Há dois anos estávamos lutando contra essa lei porque sabíamos que as empresas usariam essa brecha. Em vez de melhorar essa lei, que já não era boa, o governo a piorou.

Outra questão é a lei de mídia. Nós temos televisão pública, temos jornais e uma lei que diz que empresas de jornal não podem ser donas de televisão. O atual governo quer mudar isso, sob a alegação de competitividade. Os movimentos sociais e o Partido Liberal criaram uma coalizão juntamente com o Partido dos Trabalhadores e os partidos menores mas, mesmo assim, não temos o número suficiente [no Parlamento] para deter essa lei através do processo regular. Como consequência, ocupamos a Assembleia Nacional porque não tínhamos outra opção. O governo está, então, usando a situação econômica para mudar as leis trabalhistas e as leis de mídia.

Como a crise tem atingido o país?

Temos o índice do desemprego, que é muito sério. Além disso, a maior parte dos trabalhadores hoje é irregular, e nem trabalho temporário está fácil de conseguir. A indústria de automóveis, principalmente, têm reduzido o número de trabalhadores, como a Hyundai e a Kia. Uma empresa de carros chamada Ssangyong reduziu o número de trabalhadores e, agora, por dois meses, estes entraram em greve, ocuparam a fábrica. Eles não causaram nenhum problema na produção, ninguém tinha causado qualquer problema para a empresa e, de repente, perderam o emprego, foram demitidos. Por que nós vamos ter que perder nosso trabalho e eles não vão perder nada? Eles despediram mais de mil trabalhadores, metade do total. Esse é um exemplo da crise e das consequências e ações dos trabalhadores.

Em termos de propostas, o que surge por parte da classe trabalhadora?

Os sindicatos querem que o governo disponibilize recursos públicos para que as empresas garantam os empregos dos trabalhadores. Essa é a proposta dos sindicatos. O governo também queria mudar a lei do salário mínimo. Nela, existe um item específico que fala que todos têm que receber o salário mínimo, com exceção das pessoas com deficiência física e as pessoas acima de 60 anos. Então, para estas pessoas, a empresa pode pagar menos do que o salário mínimo. O que quer o governo coreano é expandir essa cláusula, mas o que nós queremos é aumentar o salário mínimo e criar restrições para qualquer tipo de exceção. É um governo extremamente desumano, o salário mínimo já é para os mais pobres e eles ainda querem diminuir a renda daqueles que já são muito pobres. Esse é um exemplo em que a desculpa é sempre a situação econômica.

Como tem sido então a relação das organizações progressistas com o novo governo?

Até dezembro de 2007, quando o novo presidente [Lee Myung-bak] entrou no poder, a gente teve um período relativamente bom. O governo anterior considerava todas as pessoas como povo e tentava mostrar que tinha a intenção de trabalhar para as pessoas comuns. Mas, agora, o atual governo praticamente retrocedeu, em mais de dez anos, para o período militar da Coreia. É uma situação semelhante à situação que nós tínhamos então, e nós temos que lutar contra o atual governo para voltar a esses dez anos democráticos em questões trabalhistas, de direitos humanos, da mídia, em todas as áreas da sociedade. Se fazemos hoje um pequeno protesto, a reação do governo é nos prender, colocar na cadeia, o que não acontecia no período democrático. A repressão aumentou muito.

Como está a relação entre as duas Coreias?

É muito importante enfatizar a relação da Coreia do Norte com a Coreia do Sul. Nos últimos dez anos, estava progredindo. Tivemos duas cúpulas entre as duas Coreias e também desenvolvemos uma relação de cooperação econômica, criando uma zona econômica especial perto da fronteira, um complexo industrial em Kaesong, localizado na Coreia do Norte. As empresas da Coreia do Sul estão investindo e iniciando operações lá. Nos últimos dez anos, nós podíamos ir para Kaesong, podíamos ir também para a capital da Coreia do Norte, que é Pyongyang, mas a população da Coreia do Norte não podia descer [para a Coreia do Sul]. Mas, desde que o novo governo entrou no poder, está se tornando cada vez mais difícil ir para a Coreia do Norte. O atual governo está se tornando uma obstrução para a construção de relações entre os dois países. Há também a questão nuclear. A Coreia do Norte lançou alguns satélites e fizeram testes nucleares. Como consequência, algumas leis agora estão apertando o cerco contra a Coreia do Norte. Os Estados Unidos fortaleceram as sanções econômicas ao país, que está se tornando mais isolado na comunidade internacional também em consequência das ações do nosso atual governo. A fronteira da Coreia do Sul com a Coreia do Norte, na realidade, é um resíduo da Guerra Fria. É o único lugar no mundo onde ainda existe esse resíduo que, no resto do mundo, não tem mais.

Como as organizações progressistas agem em relação à Coreia do Norte? Que ações estão sendo feitas?

Sob nossa rede de organizações, a Aliança Coreana de Movimentos Progressistas, temos muitas organizações trabalhando nos movimentos de paz e nas questões de reunificação. Por exemplo, temos uma organização chamada Coalizão Pan-coreana, que promoveu a declaração de 15 de junho [em 2000], quando os líderes da Coreia do Norte e da Coreia do Sul se encontraram em uma cúpula. Nessa declaração, eles determinavam uma reunificação pacífica, com respeito mútuo, e também para o desenvolvimento cooperativo de relações econômicas. Isso foi um momento muito importante para dissolver um período de tensão e conflito passar para uma relação de amizade e cooperação. Depois dessa declaração, nós pudemos desenvolver o complexo industrial de Kaesong. Os sul-coreanos costumavam pensar na Coreia do Norte como um país extremamente hostil antes dessa cúpula, mas depois disso, passaram a adotar uma posição diferente. Agora, estamos entrando em uma nova fase porque, com o novo governo, isso está sendo revertido, e a população da Coreia do Sul começa a ver novamente a Coreia do Norte como um país hostil, com quem eles não podem ter nenhuma relação de amizade. Isso é construído pelo governo dos Estados Unidos e também pela mídia local. A declaração de 15 de junho foi assinada pelos dois líderes das duas Coreias e, por isso, nós temos que lutar para manter e respeitar essa declaração. Mas o que o atual governo está fazendo é ignorá-la. E a Coreia do Norte pensa: “se você ignora a declaração assinada pelo antigo governo, então também não vamos poder respeitar a sua posição”. Isso significa que a Coreia do Norte começa a ver a Coreia do Sul como uma ameaça. O objetivo principal das pessoas agora é o movimento de reunificação, mas os Estados Unidos e o governo sul-coreano ignoram esse desejo. Por isso, temos que lutar contra os governos estadunidense e sul-coreano, porque eles são o principal obstáculo para a reunificação.